quinta-feira, 16 de outubro de 2025

O CORDELISTA PRESO

 


"O CORDELISTA PRESO"


A literatura de cordel, como sabemos, tem o que podemos chamar de uma “salada de rimas”. Isso deixa a leitura rica, prazerosa e suave para ler. Leandro Gomes de Barros, um dos pioneiros dessa arte, sabia muito bem como fazer essas misturas. Sua versatilidade é incrível, tanta que grande parte dos seus cordéis continua sendo impressa até hoje. Leandro, além de ser versátil nas rimas, também abordava vários temas. Quem conhece a sua obra, com certeza já leu: O cachorro dos mortos, Os sofrimentos de Alzira, Alonso e Marina, A donzela Teodora, O cavalo que defecava dinheiro e tantos outros.

Nos dias atuais, percebemos que alguns cordelistas vivem presos. Mas presos de duas formas, primeiro às rimas fáceis e repetitivas como ÃO, a maioria delas se limitam a sabão, verão, não, vão, estão, irmão, e por aí vai. Quando mudam, acabam se agarrando nos verbos como: fazer, dizer, ver, morrer... ou ainda: falar, pronunciar, passar, calar... tendo também: estou, vou, falou, mergulhou e assim segue.

 


Exemplo:


Num dia de sexta-feira 

Ouviu uma voz perguntar 

-Quer passar bem em moço 

Ou quando velho ficar 

Quando foi no outro dia 

A voz tornou a falar.


Ele chamou a mulher 

Pegou então a contar 

-,Há três noites desta parte 

Ouço uma voz perguntar 

Se quero passar bem em moço 

Ou quando velho ficar.


Então lhe disse a mulher 

-Tenho um conselho pra dar 

Queira padecer em moço, 

Antes de velho ficar- 

Você, enquanto for moço 

Tem força pra trabalhar.


Cordel: O Capitão do Navio (Silvino Pirauá)


O cordelista precisa se arriscar mais nas rimas, porém muitos vivem presos a elas. Isso não significa que ter uma ou outra estrofe com esse tipo de rima seja um problema ou defeito. O problema é se agarrar a elas com unhas e dentes, como se fossem as únicas, deixando tantas outras de lado.

Outra prisão que vejo é o cordelista ter toda a sua obra destinada a falar sofre o sertão, a fome, a seca e a miséria como se o cordel se limitasse a apenas isso, tanto que o leitor mal informado, quando é indagado sobre o que é cordel, logo responde que são aqueles “livrinhos falando sobre a seca do sertão”. Mais uma vez explico: não são proibidos esses temas, a questão quando o autor fica preso a eles, dando a impressão ao leitor que não existem outros. Por isso, convido os amigos cordelistas a conhecerem o quanto é ampla e variada a temática abordada na literatura de cordel, principalmente nos cordéis clássicos.

Gostaria que deixasse nos comentários a sua opinião a respeito da importância da versatilidade de rimas e de temas na literatura de cordel.


3 comentários:

  1. Perfeito Zeca, fugir das obviedades, deixar a preguiça de lado, estudar muito e de desprender das algemas da mediocridade. Só assim sua poesia dará um salto. Parabéns

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  2. Parabéns Zeca, concordo com tuas palavras, sem querer ofender, acho que é um pouco de preguiça de pensar que faz isso acontecer. Infelizmente essa busca pelo "fácil" cria um esteriótipo falso para o cordel e faz com que os novos cordelistas acreditem que esse formato é a identidade do cordel. Mas eu não culpo os novos cordelistas por isso, estou a quase 10 anos no cordel e vejo isso desde que entrei na vida cordeliana, acredito que isso só vai mudar quando cordelistas "de carreira" começarem a perceber que não é só falar e sim mudar os hábitos, que vai enriquecer o Cordel Brasileiro.

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  3. Meu grande amigo e mestre Zeca, sábias palavras. A masmorra da mesmice, aprisiona muita gente. O cárcere mental priva os poetas de criatividade e sobretudo de capacidade. Sobre as rimas, deve ser como você disse: uma salada. Num cordel de 32 estrofes não há problema nenhum usar a rima ão ou ar uma ou duas vezes de forma bem espassada. Quanto ao tema, esqueceu de mencionar a repetição cansativa sobre o tema cangaço atualmente as pautas identitárias e, PIOR, o plágio ou cópia escancarada dos clássicos, pegando uma receita de sucesso já pronta sem trazer algo novo ou inédito. Não vou nem comentar sobre pegar obras já consolidadas, problematiza-las e reescreve-las enchendo o folheto de discursos panfletário e deixando a narrativa de fato de lado. O escritor de cordel precisa várias os temas: Infantil, Político, Futebol, Gracejo, Critica e sarcasmo, erótico, fantasia, filosofia, pedagógico e tudo o mais possível. Os temas precisam ser versados de forma atemporal também . Para que daqui a 30 anos sejam lembrados vide Leandro Gomes de Barros, José Pacheco etc

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